domingo, 20 de maio de 2012

BGC - Tema 4

AMEAÇAS À GEODIVERSIDADE
(Alterado / Republicado em 22 de Maio de 2012)


1. Contextualização

Tal como já ficou bem explicito em publicações anteriores neste blogue, a Geodiversidade “é um dos pilares da Natureza,” e, além do seu inegável valor intrínseco “é o suporte físico da biodiversidade.” [1]. De acordo com Nascimento et al, 2008, é definido como “[...] a variedade natural de aspetos geológicos (minerais, rochas e fósseis), geomorfológicos (formas de relevo, processos) e do solo. Inclui as suas coleções, relações, propriedades, interpretações e sistemas” [2]

Assim, nunca é demais relembrar, no sentido de entendermos o que são as “Ameaças”, que Geodiversidade - em geral - pode ser entendida como a variedade (a diversidade) de elementos e processos geológicos, sob qualquer forma, a qualquer escala e a qualquer nível de integração, sendo elementos, entre outros, as rochas, os fósseis, os estratos geológicos,  os solos, os recursos minerais, o petróleo, as águas subterrâneas, o carvão mineral mas, também, as estruturas geológicas, as paisagens e o relevo da superfície terrestre, e a geodiversidade, tal como a biodiversidade, e a diversidade cultural, constitui um valor fundamental do mundo em que vivemos. [3]

Segundo Brilha, 2005:40, “a maior parte das ameaças à geodiversidade advém, direta ou indiretamente, da atividade humana” e na sequência do parágrafo anterior “não existem grandes diferenças no que respeita às ameaças para com a geo ou a biodiversidade”[5]. Posto neste prisma fica bem claro que é imperativo e imprescindível a sua proteção, não apenas pelo lado ético, mas também porque é condição essencial para o  desenvolvimento sustentável e para melhor qualidade de vida e, está provado, a proteção não existe se nela não incluirmos geodiversidade.[3] Daí a urgente necessidade da identificação e diagnóstico das “Ameaças”, mote para este artigo.

Reconhecer que a Geodiversidade está sujeita a ameaças graves idênticas, e por vezes correlacionadas, às que pressionam a biodiversidade, implica, também, perceber um aspeto fundamental: “que a geologia apesar da resiliência “natural” não é imune às intervenções humanas por muito lentos e invisíveis ao olhar humano que os efeitos de tais intervenções possam parecer.” O facto de algumas dessas intervenções serem efetivas há tempo demais facilita a sua incorporação na leitura do sítio geológico quase como elementos dominantes, caso do “Cabo Mondego” que já aqui vos apresentei e que, sendo um caso em particular, é um bom ponto de partida para o entendimento deste artigo de ordem mais abrangente.

2. Ameaças

Desde sempre o planeta foi alvo de fenómenos geológicos e que, em milhões de anos, o alteraram de forma radical porquanto ocorrem na Terra desde a sua formação. Mesmo os acontecimentos mais destrutivos, como os sismos e as erupções vulcânicas fazem parte do normal funcionamento do nosso planeta. Todavia, com o crescimento da população humana, grandes áreas da superfície terrestre foram ocupadas. A exploração e ocupação desordenadas agravam os riscos naturais e impõem a necessidade de um ordenamento eficaz do território, seja em termos de simples ocupação, seja nas atividades [3].

Assim e fruto dessas atividades humanas constituem ameaças à geodiversidade (Brilha, 2005:40-51), a exploração dos recursos geológicos, o desenvolvimento de obras e infraestruturas, a gestão das bacias hidrográficas, a florestação, desflorestação e agricultura, as atividades militares, as atividades recreativas e turísticas, a colheita de amostras geológicas para fins não científicos e a iliteracia cultural [5]. Todavia, além destas e em escalas menores muitas outras contribuem para a destruição geológica e, aqui, não podemos esquecer a poluição dos solos, das águas (a todos os níveis dado que mesmo ao nível atmosférico são grandes os impactes nos solos, por força do ciclo), o ordenamento do território (principalmente junto à costa).

Um exercício interessante que convido a fazer é uma análise detalhada da publicação “Ameaças à biodiversidade” e a analogia flagrante entre as ameaças aí descritas e as aplicáveis à geodiversidade, acima referidas ou não, e prova clara de que (Brilha, 2005:40): “não existem grandes diferenças no que respeita às ameaças para com a geo ou a biodiversidade”[5]:


2.1 - Destruição, degradação e fragmentação do habitat - Esta é, por certo, a principal ameaça: o abate de árvores para obtenção de madeira é muito frequente nas zonas tropicais, bem como a destruição de florestas, para converter os terrenos em zonas agrícolas. Esta alteração de uso dos solos interfere de forma muito visível nos seus aspetos físico e químicos. A urbanização crescente, a construção de grandes redes viárias, portos e aeroportos, barragens e outras infraestruturas, com enormes volumes de massas movimentadas, fragmentadas e destruídas, e a drenagem de zonas húmidas são outras das principais causas de destruição e degradação. A construção de cada vez maiores infraestruturas rodoviárias e aeroportuárias tem contribuído para perdas elevadíssimas, assim como práticas destrutivas de uso e aproveitamento da terra: abate e exploração de florestas para produção de combustível, materiais de construção, produção de sal, exploração de areias costeiras e minerais e shrimp farming. Aspeto muito importante a merecer a atenção prende-se com as mudanças na utilização dos solos, que os fragmentam, degradam e destroem. Esta mudança de afetação deve-se, principalmente, ao crescimento demográfico e ao aumento do consumo por habitante, dois fatores que irão intensificar-se no futuro e gerar maiores pressões.


2.2 - As alterações climáticas – Entre outros originam mudança nos cursos dos rios resultando no aumento da sedimentação de sistemas marinhos, mudam a temperatura das águas, e até, por força daquelas, temos branqueamento dos corais, entre muitos outros. Sendo certo que o planeta Terra desde a sua origem sempre sofreu alterações profundas no clima, alternando entre períodos glaciares e outros de clima mais ameno, por diversos fatores (alterações na intensidade da radiação solar, na inclinação do eixo da Terra e na curvatura da sua orbita em torno do Sol, alterando o clima numa escala milenar), e ainda à disposição dos continentes, alterações nas correntes marinhas e de composição da atmosfera, bem como eventos como o impacto de meteoritos ou a erupção de vulcões, é também mais que certo que a ação do Homem nos últimos dois séculos (pior no séc. XX) tem produzido alterações climáticas, principalmente através da emissão de gases com efeito de estufa, que provocam um aquecimento global do clima. Esta alteração de clima, embora em processo muto lento, interfere com os processos geológicos.
2.2.1 - Efeito de Estufa – A atmosfera da Terra funciona em mecanismo similar relativamente ao planeta, pela existência de gases tão necessários à passagem dos raios solares e à retenção do calor que é irradiado, gases esses sem os quais o planeta teria temperaturas baixas e seria inabitável, destacando-se como principal gás o vapor de água. Todavia quando se fala de gases com efeito de estufa fala-se principalmente de seis compostos, sendo 3 naturais, o dióxido de carbono (CO2), o metano (CH4) e o óxido nitroso (N2O), e os outros 3 fruto das atividades humanas: os hidrofluorcarbonetos (HFC), os perfluorcarbonetos (PFC) e o hexafluoreto de enxofre (SF6). [7]  O dióxido de carbono é o mais nefasto contribuindo para o aumento da temperatura global nos últimos 50 anos e serve como indicador comum para medir todos os gases com efeito de estufa sendo as emissões de todos os outros gases expressas em “equivalentes de dióxido de carbono”. [7]
2.2.2 - Consequências do aquecimento global - São inegáveis as modificações nos que a subida das temperaturas vai provocar, com consequências em perda de área florestal, não só pela seca como pelo aumento dos incêndios. “Daí a maior consequência advir do aumento da temperatura média, que subiu cerca de 0,6 ºC no século XX, e, até 2100, poderá aumentar entre 1,4 e 5,8 ºC, prevendo-se que o maior aquecimento ocorrerá em latitudes altas no hemisfério Norte e na Antártida” [4]. As alterações surgirão no nível do mar que “poderá subir entre 9 e 88 cm até 2100, pela “dilatação” dos oceanos e do derretimento de glaciares e calotas polares” [4]. Erosão costeira vai aumentar, pondo em risco povoações/infra-estruturas. Serão muito afetados recifes de coral, estuários e mangais.


2.3 - Sobre-exploração dos recursos geológicos – Algum locais e/ou materiais geológicos, são sobre exploradas como recurso, ao ponto de serem colocadas em risco de extinção, ou de se desequilibrar o ecossistema que neles vivem. Muitos assentam na valorização do aspeto económico do recurso geológico, cuja dimensão não renovável, finita não é considerada; perda parcial ou total do recurso já que a exploração só é interrompida no limite ou suspensa devido a crises de mercado, interrupção do processo natural desequilibrando as relações geológicas e enfraquecendo as estruturas face a outros fenómenos naturais (sismos), perda de acesso por parte das populações face ao risco das explorações e perda de valor estético, poluição e impacto visual com produção de ruídos e poeiras nocivos aos ecossistemas envolventes, perda de visibilidade e de interesse com a escavação da pedreira a dominar a imagem do sítio, são apenas algumas das ameaças diretas e indiretas que se podem elencar [3]. 


2.4 – A Poluição – Este assunto é de tal forma importante que a ele dedicamos um outro ponto intitulado “Poluição dos solos”. Esta resulta da introdução de poluentes no ambiente, daí resultando efeitos nocivos para a diversidade geológica. Os poluentes podem ser dos mais variados tipos: substâncias químicas, radioatividade, calor, luz, ruído ou energia. Na água a atividade humana produz efeitos adversos nas massas de água, desde os mares, rios e lagos às águas subterrâneas. Os poluentes da água incluem um largo espectro de químicos e agentes patogénicos e podem causar alterações nas propriedades físico-químicas da água, incluindo a sua temperatura, oxigenação, pH ou condutividade, alterações essas que se vão refletir, inequivocamente sobre a geodiversidade.


2.5 – Outros – Nunca será demais lembrar o que acima referimos (Brilha, 2005:40-51): "a exploração dos recursos geológicos, o desenvolvimento de obras e infraestruturas, a gestão das bacias hidrográficas, a florestação, desflorestação e agricultura, as atividades militares, as atividades recreativas e turísticas, a colheita de amostras geológicas para fins não científicos e a iliteracia cultural [5]. Todavia, além destas e em escalas menores muitas outras contribuem para a destruição geológica e, aqui, não podemos esquecer a poluição dos solos, das águas (a todos os níveis dado que mesmo ao nível atmosférico são grandes os impactes nos solos, por força do ciclo), o ordenamento do território (principalmente junto à costa)."

3 . Conclusão


Os fenómenos geológicos fazem parte da história do planeta e nele ocorrem desde a sua formação. “Mesmo os acontecimentos mais destrutivos, como os sismos e as erupções vulcânicas fazem parte do normal funcionamento do nosso planeta. Com o crescimento da população humana, grandes áreas da superfície terrestre foram ocupadas. A ocupação desordenada agrava os riscos naturais e impõe a necessidade de um ordenamento eficaz do território” [3]

No ritmo a que esta sociedade consumista caminha cada vez é mais difícil contornar os graves problemas associados às perdas de geodiversidade já não bastando “estabelecer limites à exploração dos recursos, reduzindo planos de lavra e elaborando planos de requalificação; importaria descobrir o verdadeiro custo dos produtos resultantes dessa exploração ponderando o valor económico em conjunto com o valor científico, estético, patrimonial, cultural e recreativo, o que eventualmente levaria à descoberta de outros materiais de substituição, menos agressivos para a geologia e assim se conseguiria reduzir a pressão na sobre exploração dos recursos geológicos.” [4]

______________________________________FIM

Fontes e Bibliografia:
[1] - http://paleoviva.fc.ul.pt/almafossil/Grafitos/Grafit01.htm, consultado em 16 de Maio de 2012;
[2] - LEITE DO NASCIMENTO, M. A. L. do; RUCHKYS, U. A.; MANTESSO-NETO, V. Geodiversidade, Geoconservação e Geoturismo – trinômio importante para a proteção do patrimônio geológico. São Paulo: Sociedade Brasileira de Geologia, 2008.
[5] - Brilha, José, 2005. Património Geológico e Geoconservação – A Conservação da Natureza na sua Vertente Geológica. Pg 40-51, Palimage. Imagem Palavra. Braga.
[6] - http://www.anoplanetaterra.org/, consultado em 19 de Maio de 2012;
[7] - http://www.terramater.pt/?pag=117, consultado em 20 de Abril de 2012

Ameaças - Poluição dos solos



____________________________ EM CONSTRUÇÃO ________________________________

segunda-feira, 7 de maio de 2012

Cabo Mondego


Cabo Mondego – Figueira da Foz 
Das pegadas de dinossauro ao maior e melhor afloramento do Jurássico da Europa

Por José Carlos Leite


O tema em estudo – Geodiversidade - é, a exemplo do que já falamos em "Biodiversidade", um “conceito” recente. Tal como no usado para comparação Geodiversidade refere-se a “Diversidade Geológica” e é reconhecido e começou a ser divulgado recentemente, na década de 1990, por geólogos e geomorfólogos preocupados em estudar a natureza na vertente geológica. Não existem referências que permitam concluir quando o termo foi utilizado a primeira vez, mas “sabe-se que os primeiros trabalhos foram realizados na Tasmânia (Austrália) e principalmente no Reino Unido, em 1993, na Conferência de Malvern sobre Conservação Geológica e Paisagística” (BRILHA, 2005). [1]
Da pesquisa e leituras muito teríamos, em resultado, a dizer sobre “Geodiversidade” e os indicados, também, para estudo de “Geoconservação” e “Património Geológico”.
Todavia não vamos cair nessa tentação dado que o material serviu de “ponto de partida” para outras descobertas e o caso que se pretende apresentar retrata na prática todas as preocupações nas vertentes em estudo e merece divulgação e conhecimento.

As “lutas” a travar pelo reconhecimento de locais são inglórias e apenas muito recentemente se começou a atribuir importância. O desprezo com que os locais foram olhados e, até, o desprezo com que os defensores (“tolinhos” das pedras) foram encarados espelham o pouco reconhecimento.
Venho trazer-vos ao conhecimento uma das lutas de nomes conhecidos nas ciências lusas, como Galopim de Carvalho e Helena Henriques, a par com um dos mais ricos locais da Europa em matéria de Riqueza, Geodiversidade, Património Geológico e urgente necessidade de Geoconservação:

Cabo Mondego:

Saliência da costa ocidental portuguesa, a noroeste da cidade da Figueira da Foz e da foz do rio Mondego, no prolongamento da serra de Buarcos. [2]
Situa-se a cerca de 200Km a norte de Lisboa, no bordo ocidental da Serra da Boa Viagem, ao longo da costa, entre praias da Murtinheira e da Figueira da Foz. Constitui testemunho irrepetível e insubstituível para a compreensão da história geológica de Portugal; representa, de forma particularmente completa, alguns dos mais importantes episódios da história da Terra ocorridos durante o Jurássico, para intervalo de tempo que se situa aproximadamente entre os 185 e os 140 milhões de anos, o que justifica, a nível internacional, a relevância da sua classificação, conservação e divulgação.
Data de 1884 a primeira referência conhecida de pegadas nas falésias do Cabo Mondego. Jacinto Pedro Gomes (JPG), ao elaborar um Relatório acerca das minas do Cabo Mondego, foi informado da presença de moldes de pegadas. Mostrou desenhos destas a B.Geinitz, que lhe disse deverem ser de dinossauro; Karl Zittel corroborou aquela opinião. Louis Dollo atribuiu-as a Ornitópodes.

Helena Henriques, geóloga:
É urgente impedir a delapidação” 

Esta reconhecida geóloga muito se bateu pelo reconhecimento, nacional e internacional, do valor histórico-científico das falésias jurássicas do Cabo Mondego. Chegou a levar a questão que é a “menina dos seus olhos” ao “VI Simpósio Internacional do Jurássico”, em Itália, onde existe já grupo de pressão para que a UNESCO reconheça este como um Património da Humanidade, atendendo à sua função de “referência de tempo à escala global”. Helena Henriques explicou que “é um pouco como um templo egípcio, só que este é milhões de anos mais antigo”.

No sector ocidental da Serra da Boa Viagem (Cabo Mondego) aflora uma espessa série de sedimentos, que registam, de forma notável, alguns dos principais acontecimentos da História da Terra. O intervalo de tempo registado situa-se aproximadamente entre os 180 e os 140 milhões de anos, isto é, refere-se ao Jurássico Médio e Superior.
Para o intervalo de tempo considerado, os marcadores estratigráficos normalmente utilizados em sedimentos marinhos são as amonites, um grupo extinto de moluscos cefalópodes, que se assemelhavam às actuais lulas e chocos. A ocorrência destes fósseis no Jurássico Médio do Cabo Mondego (flanco norte da Serra da Boa Viagem) é particularmente relevante, na medida em que, com base na sua distribuição vertical, se conseguem precisar as escalas do tempo geológico.
Os locais com registo sedimentar expressivo e com conteúdo elevado em amonites são de grande interesse para as Ciências da Terra, dado que testemunham com rigor determinado intervalo de tempo da História da Terra. O Jurássico Médio do Cabo Mondego apresenta essa particularidade, sendo há muito considerado referência, a nível internacional, nas discussões da especialidade.
O Jurássico Superior, cujos sedimentos assentam sobre o Jurássico Médio (sector sul da Serra da Boa Viagem), proporciona a observação de corpos sedimentares característicos de ambientes de transição (recifais, lacustres, deltaicos).
O registo sedimentar inclui uma grande variedade de estruturas sedimentares bem definidas, acompanhadas de associações diversificadas de fósseis típicos de diferentes ambientes (corais, equinodermes, bivalves, braquiópodes, gasterópodes, crinóides, restos vegetais). É justamente nesta posição estratigráfica (Oxfordiano) que, em 1884, foram reconhecidas várias pegadas de dinossaúrios terópodes, atribuídas a megalosaurídeos."[3]


"A História Geológica do nosso país durante os tempos jurássicos está inscrita nas falésias do Cabo Mondego. 
Preserve-a porque ela não se repete." 

Para Helena Henriques, lutadora pela classificação, sobretudo, para impedir “a delapidação” deste património comum de invulgar interesse e valor histórico-científico. “O emparedamento da zona frente ao restaurante Teimoso, por exemplo, a ser continuado pela linha da Marginal, significaria a destruição das falésias que restam”, afirma, acrescentando porém que “a vulnerabilidade face à urbanização, daquela área”, é outra, senão a principal, das preocupações. 

Em 1996, a UNESCO declarou o Cabo Mondego como estratotipo do limiar Aaleniano-Bajociano, os dois subperíodos em que se divide o Jurássico médio, período ocorrido entre há 180 milhões e 151 milhões de anos[3]. A razão da distinção é de fácil compreensão. Nas sucessivas camadas geológicas das falésias do Cabo Mondego são visíveis diversos elementos fósseis conservados: pegadas de dinossauros, amonites (cefalópodes fósseis de concha espiralada) e vegetais, pelo que qualquer descoberta ou metodologia de investigação só será validada após comparação com o Cabo Mondego, transformando este local num “marcador de tempo com valor global”[3]. O caricato, porém, é que apesar do estatuto internacional, as falésias morrem de esperar pela classificação até porque os primeiros pedidos datam dos anos 70, e Helena Heniques declarou publicamente acreditar que é “a falta de cultura científica da população” que tem permitido “a inércia de quem manda”, um motivo aliado aos alegados “interesses económicos a que a Cimpor não é alheia”. [3]

Um dos motivos importantes a avaliar é, porquê neste local, porquê no Cabo Mondego? Pelos paleontólogos é defendido que que, há cerca de cento e cinquenta milhões de anos, a costa portuguesa tinha um aspeto bem diferente. “Seria, então, constituída por lagoas e deltas de rios, que inundavam uma vasta região pantanosa, com águas pouco profundas, calmas e mornas. Devido às condições climatéricas, aqui se concentrava uma rica vegetação, que atraía os dinossauros, na sua maioria vegetarianos. Mas estas características foram benéficas para a História ainda por outra razão. Elas criaram as melhores condições para uma fossilização duradoura dos animais mortos. A comprovar esta teoria, estão as centenas de achados fósseis de plantas, peixes, conchas, escamas, tartarugas, crocodilos e outros animais de menor porte, que frequentaram a região, nas épocas de ouro dos dinossauros, Jurássico Superior e Cretáceo. Por isso, toda a zona Oeste é hoje um verdadeiro santuário, que segundo os estudiosos deve ser alvo de uma preservação “total e imediata”. Impedir a construção clandestina, não vazar lixos, evitar a abertura de acessos mesmo até ao areal das praias, são algumas das medidas exigidas pelos defensores daquele património.”[3]

Perante estes factos e estas lutas devemos preocupar-nos e ser solidários principalmente tendo em vista o legado a deixar aos vindouros. Com a classificação de locais como este “Cabo Mondego”, quer como Monumento Natural quer como Património da Humanidade (através da UNESCO), “fica garantida a preservação de um local, onde facilmente se compreendem questões como a evolução biológica e a configuração do planeta, ao longo de milhões de anos”. [3]

Para já, no que respeita à classificação pela UNESCO, não há mais do que um grupo de pressão, mas a concretizar-se, este seria um passo dos passos mais importantes.

Apoiem e divulguem esta causa!

                                                                            FIM

Fontes e Bibliografia:
[1] – Brilha, J. (2005). Património Geológico e Geconservação. Braga: Palimago
[2] - Cabo Mondego. In Infopédia [Em linha]. Porto: Porto Editora, 2003-2012. [Consult. 2012-05-07]. Disponível na www: <URL: http://www.infopedia.pt/$cabo-mondego>
[3] - http://www.progeo.pt/jornais/cabo_mond4.htm, [Consult. 2012-05-07]

BGC - Tema 3



Geodiversidade. Conceito e valores
Geodiversidade, Geoconservação e Património Geológico

José Carlos Leite


Fará sentido, em termos de conservação,
reduzir a Natureza à sua componente viva?
Não estarão o mundo biótico e abiótico
inexoravelmente interligados?

Vivemos numa zona onde devemos ter particular atenção sobre os assuntos aqui abordados, dada a ação nefasta do homem nestes temas: o Baixo Mondego.

Temo-nos habituado a encarar o Ambiente apenas numa perspetiva dos seres vivos e a sensibilidade relativamente aos inertes é, ainda, muito residual… Mas o Planeta não é só animais e plantas, não é só vida e, mesmo para a sobrevivência destes, os inertes ocupam papel fulcral. A ação do Homem também é nefasta sobre a Terra e sobre os materiais que o constituem e temos pela frente graves problemas para resolver relacionados com o uso dos solos e dos seus constituintes e, lamentavelmente, estes não se reduzem aos efeitos sobre a diversidade biológica.
Ora é exatamente este o campo de ação da Geodiversidade, da Geoconservação e do Património Geológico, áreas a serem encaradas com cada vez maior atenção. Estes novos termos, com poucas décadas, têm vindo a surgir e a ampliar o seu significado.
É, por isso, importante que se faça aqui uma abordagem diferenciando os três termos em causa e outros associados, identificando e compreendendo o sentido evolutivo do respetivo significado. Este é o mote para a abordagem que vamos fazer a seguir:

Antecedendo os termos que vamos analisar surge a ciência Geologia, de definição:
“...do grego γη- (ge-, "a terra") e λογος (logos, "palavra", "razão"), é a ciência que estuda a Terra, sua composição, estrutura, propriedades físicas, história e os processos que lhe dão forma. É uma das ciências da Terra. A geologia foi essencial para determinar a idade da Terra, que se calculou ter cerca de 4,6 bilhões de anos e a desenvolver a teoria denominada tectônica de placas segundo a qual a litosfera terrestre, que é rígida e formada pela crosta e o manto superior dispõe-se fragmentada em várias placas tectônicas as quais se deslocam sobre a astenosfera que tem comportamento plástico.”[1]

Também não é demais, e já em tópico anterior abordamos esta questão, relembrar outros conceitos cruciais: falar do “Valor da Geodiversidade”, falar de “valor” é uma questão mais profunda do que à primeira vista parece. Relacionados com “valor” temos, segundo Vaz e Delfino, 2010, que perceber como se encadeiam os seus elementos constituintes surgindo, assim, os conceitos de “valor extrínseco” e “valor intrínseco”:
- o extrínseco é o valor derivado, por exemplo, o valor instrumental das coisas por causa da sua utilização atual ou potencial e o valor artístico que deriva da apreciação por terceiros, podendo ser instrumental, por causa da sua utilização atual ou potencial, ou inerente, como as obras de arte ou outros objetos de apreciação - caso dos objetos naturais,
- e o “valor intrínseco”, de difícil explicação, é o valor que uma determinada coisa tem devido á sua própria natureza, e as coisas são “intrinsecamente” valiosas, sem outras razões, porque meramente existem motivações para as promover, apreciar ou proteger devido à sua própria natureza.
O valor instrumental tem, assim, a ver com a nossa vontade, interesses e desejos e o intrínseco tem a ver com aquilo que a coisa representa e não pelo modo de uso.

É nessas suas vertentes que temos que enquadrar o termo “valor”, associado ao que vamos expor.

1. Geodiversidade

Não podemos considerar existir uma definição abrangente e única tal é a amplitude da sua aplicação porque, segundo Brilha, 2005:22, ela “resulta de uma multiplicidade de fatores e da relação entre eles”. Entendemos que é por essa multiplicidade que ainda não temos uma definição consensual, o que acarreta que as diversas especialidades vão adotando a definição ao seu campo de atuação com enfase para os aspetos que mais lhe dizem respeito. Para este autor os primeiros responsáveis da diversidade são os cerca de 90 elementos químicos, sendo os minerais resultado da combinação desses produtos - conhecendo-se quase 4000 (Wenk&Bulakh,2004). A associação dos minerais dá origem às rochas. Depois de formadas as rochas podem formar dobras e fraturas sobre as quais atuam os agentes atmosféricos. Depois o clima, a pressão, a presença da água dão, também, o seu contributo. A estes acrescem outros fatores.
Uma simples combinação de todas as situações descritas dará uma infinidade de resultados diferentes. E por aqui se entende como encontramos elementos tão distintos.
Por outro lado o termo começou a ser usado recentemente, na década de 1990, por geólogos e geomorfólogos preocupados em estudar a natureza na vertente geológica. Não existem referências que permitam concluir quando o termo foi utilizado a primeira vez, mas “sabe-se que os primeiros trabalhos foram realizados na Tasmânia (Austrália) e principalmente no Reino Unido, em 1993, na Conferência de Malvern sobre Conservação Geológica e Paisagística” (BRILHA, 2005).
Assim sendo e em termos evolutivos apresentamos uma tabela resumo da cronologia:


Deixámos, então, algumas das definições que fomos encontrando nas nossas pesquisas, sendo certo que a base se prende com a variedade de ambientes geológicos, fenómenos e processos ativos que dão origem a paisagens, rochas, minerais, fósseis, solos e outros depósitos superficiais que são o suporte para a vida na Terra:
A geodiversidade (ou diversidade geológica) é a variedade (a diversidade) de elementos e de processos geológicos, sob qualquer forma, a qualquer escala e a qualquer nível de integração, existente no planeta Terra (do grego gê, Terra + latim diversitate, diversidade). O conceito de geodiversidade é um conceito integrador fundamental que engloba todos os materiais e fenómenos geológicos que dão corpo ao Planeta e o modificam (a sua estrutura e a sua superfície) e que, em conjugação com a biodiversidade, define a essência material da Terra e o modo como ela se transforma e evolui.” [3]
 “Entende-se por geodiversidade a variação natural dos aspectos geológicos (rochas, minerais, fósseis), geomorfológicos (formas e evolução de relevo) e do solo. É importante ressaltar que não inclui apenas elementos abióticos da natureza, mas também os bióticos (ARAÚJO, 2005).
Azevedo (2007) define geodiversidade como variação litológica das rochas, processos geológicos, diversidade dos solos e como os afloramentos estão dispostos na superfície da Terra.
Para a Associação Européia para a Conservação do Patrimônio Geológico (PROGEO) e para a Sociedade Real da Conservação da Natureza do Reino Unido, geodiversidade consiste na variedade de ambientes geológicos, fenômenos e processos ativos geradores de paisagem (relevo), rochas, minerais, fósseis, solos e outros depósitos superficiais, bases de vida na Terra (AZEVEDO, 2007).
A geodiversidade é o resultado dos processos interativos entre a paisagem, a fauna, a flora e a nossa cultura. A geologia e a geomorfologia determinam a distribuição dos habitats, das espécies e dita como o homem organiza seu espaço geográfico. Porém, o interesse pela geodiversidade ainda é inferior ao interesse pela biodiversidade por parte da sociedade (ARAÚJO, 2005).” [2]

2. Património Geológico
 
“O conjunto dos aspetos e de exemplos concretos de geodiversidade, aos mais diversos níveis, que, por esta ou por aquela razão, se entendeu salvaguardar por meio de medidas especiais de proteção, tal como consignadas na legislação específica de cada país.” [3]
Para perfeito entendimento deste ponto nada como demonstrar: nesse sentido, de clarificar a importância, abordaremos em publicação a seguir, o caso do "Cabo Mondego", cuja leitura se aconselha, onde demonstraremos essa importância e provaremos o que é Património Geológico.

3. Geoconservação
 
Em primeiro lugar há que entender o porquê da necessidade da Geoconservação e a resposta está encerrada nos múltiplos valores (ver introdução sobre “valor”) que a “Diversidade geológica” tem (Brilha, 2005):
- valor intrínseco, valores culturais (espirituais, arqueológico, folclore, sentido de lugar), valores estéticos (paisagem, turismo, lazer, voluntariado) valores económicos (energia, minerais, materiais, fósseis), valores funcionais (Construção e suporte de infraestruturas, Armazenamento e reciclagem, Saúde, Incineração, Controle da poluição, Química da água, Funções do solo, Funções do geossistema, Funções do ecossistema), valor cientifico e educativo (investigação, história, monitorização, educação e formação). 
Assim, são objetivos da Geoconservação “Todas e quaisquer ações empreendidas no sentido de preservar e de defender a geodiversidade.” [3]

Entendido o que é a Geodiversidade e o que é o Património Geológico, facilmente se conclui que são, assim e agora, um valor máximo a proteger e não apenas naqueles locais e aspetos geológicos pela sua magnificência e, por isso mesmo, expressamente classificados e protegidos por lei.
Há que proteger é a geodiversidade e sítios onde estão registrados a história geológica (ex: Cabo Mondego, Figueira da Foz) do Planeta e não apenas o património geológico.
Só este respeito poderá assegurar a gestão equilibrada dos recursos geológicos (por exemplo: carvão, petróleo, areia para construção), a utilização racional dos recursos geo-hídricos (exemplo: águas subterrâneas), a proteção eficaz nos ambientes naturais para usufruto e bem-estar de todos, hoje e no futuro.

Um dos primeiros e importantes passos para a Geoconservação é o conhecimento: a inventariação geológica completa do território português foi recentemente concluída sob coordenação do Departamento de Ciências da Terra da Escola de Ciências da Universidade do Minho e é de importância científica e estratégica fundamental.
Segundo José Brilha, docente e coordenador do projeto, que envolveu mais de 70 cientistas de universidades e associações e a Fundação para a Ciência e Tecnologia, “já existia um levantamento feito ao nível da fauna e da flora, mas era fundamental classificar locais de valor abiótico [influências que os seres vivos recebem num ecossistema], com interesse científico, revelando a importância de ser gerido e preservado pelas autoridades nacionais que tratam da conservação da natureza”.
Para José Brilha há locais que não devem ser destruídos, pois são testemunhos científicos dos acontecimentos-chave que marcaram a história do planeta, nomeadamente do território português.
O projeto dá a Portugal os instrumentos necessários para implementar uma política de geoconservação, com base neste conjunto de locais que correspondem às ocorrências da geodiversidade com valor científico. Em Portugal tínhamos um ligeiro atraso neste campo, pelo que agora estamos em condições de comparar o nosso património geológico com o dos outros países. Aliás, para a sua área geográfica, Portugal é dos países europeus com maior geodiversidade.

5. Conclusão
 
Assim sendo e em conclusão, a conservação de elementos do Património Geológico constitui uma necessidade para a manutenção da qualidade de vida de todas as espécies que habitam o planeta Terra.
A vida depende da Geodiversidade e, além disto, a conservação destes elementos reveste-se de um valor científico incalculável, uma vez que eles guardam a explicação para origem e evolução deste planeta e de todas as formas de vida que nele habitam. 


                                                                          FIM
Bibliografia e Fontes:
[1] - http://pt.wikipedia.org/wiki/Geologia, consultado em 5 de maio de 2012
[2] – http://geoconservacao.blogspot.pt/p/geodiversidade.html, consultado em 6 de maio de 2012
[3] - http://pt.wikipedia.org/wiki/Geodiversidade, consultado em 5 de maio de 2012
- Brilha, J. 2005. Património Geológico e Geoconservação – A Conservação da Natureza na sua Vertente Geológica. Palimage. Imagem Palavra. Braga.
- Brilha, J. 2012. Geodiversity, geoconservation and sustainable development. Conferência em Sinaia. Earth Sciences Department University of Minho. Braga. Portugal.
- Vaz, S. & Delfino, A. (2010). Livro de Ética e Cidadania Ambiental. UAb.