segunda-feira, 7 de maio de 2012

Cabo Mondego


Cabo Mondego – Figueira da Foz 
Das pegadas de dinossauro ao maior e melhor afloramento do Jurássico da Europa

Por José Carlos Leite


O tema em estudo – Geodiversidade - é, a exemplo do que já falamos em "Biodiversidade", um “conceito” recente. Tal como no usado para comparação Geodiversidade refere-se a “Diversidade Geológica” e é reconhecido e começou a ser divulgado recentemente, na década de 1990, por geólogos e geomorfólogos preocupados em estudar a natureza na vertente geológica. Não existem referências que permitam concluir quando o termo foi utilizado a primeira vez, mas “sabe-se que os primeiros trabalhos foram realizados na Tasmânia (Austrália) e principalmente no Reino Unido, em 1993, na Conferência de Malvern sobre Conservação Geológica e Paisagística” (BRILHA, 2005). [1]
Da pesquisa e leituras muito teríamos, em resultado, a dizer sobre “Geodiversidade” e os indicados, também, para estudo de “Geoconservação” e “Património Geológico”.
Todavia não vamos cair nessa tentação dado que o material serviu de “ponto de partida” para outras descobertas e o caso que se pretende apresentar retrata na prática todas as preocupações nas vertentes em estudo e merece divulgação e conhecimento.

As “lutas” a travar pelo reconhecimento de locais são inglórias e apenas muito recentemente se começou a atribuir importância. O desprezo com que os locais foram olhados e, até, o desprezo com que os defensores (“tolinhos” das pedras) foram encarados espelham o pouco reconhecimento.
Venho trazer-vos ao conhecimento uma das lutas de nomes conhecidos nas ciências lusas, como Galopim de Carvalho e Helena Henriques, a par com um dos mais ricos locais da Europa em matéria de Riqueza, Geodiversidade, Património Geológico e urgente necessidade de Geoconservação:

Cabo Mondego:

Saliência da costa ocidental portuguesa, a noroeste da cidade da Figueira da Foz e da foz do rio Mondego, no prolongamento da serra de Buarcos. [2]
Situa-se a cerca de 200Km a norte de Lisboa, no bordo ocidental da Serra da Boa Viagem, ao longo da costa, entre praias da Murtinheira e da Figueira da Foz. Constitui testemunho irrepetível e insubstituível para a compreensão da história geológica de Portugal; representa, de forma particularmente completa, alguns dos mais importantes episódios da história da Terra ocorridos durante o Jurássico, para intervalo de tempo que se situa aproximadamente entre os 185 e os 140 milhões de anos, o que justifica, a nível internacional, a relevância da sua classificação, conservação e divulgação.
Data de 1884 a primeira referência conhecida de pegadas nas falésias do Cabo Mondego. Jacinto Pedro Gomes (JPG), ao elaborar um Relatório acerca das minas do Cabo Mondego, foi informado da presença de moldes de pegadas. Mostrou desenhos destas a B.Geinitz, que lhe disse deverem ser de dinossauro; Karl Zittel corroborou aquela opinião. Louis Dollo atribuiu-as a Ornitópodes.

Helena Henriques, geóloga:
É urgente impedir a delapidação” 

Esta reconhecida geóloga muito se bateu pelo reconhecimento, nacional e internacional, do valor histórico-científico das falésias jurássicas do Cabo Mondego. Chegou a levar a questão que é a “menina dos seus olhos” ao “VI Simpósio Internacional do Jurássico”, em Itália, onde existe já grupo de pressão para que a UNESCO reconheça este como um Património da Humanidade, atendendo à sua função de “referência de tempo à escala global”. Helena Henriques explicou que “é um pouco como um templo egípcio, só que este é milhões de anos mais antigo”.

No sector ocidental da Serra da Boa Viagem (Cabo Mondego) aflora uma espessa série de sedimentos, que registam, de forma notável, alguns dos principais acontecimentos da História da Terra. O intervalo de tempo registado situa-se aproximadamente entre os 180 e os 140 milhões de anos, isto é, refere-se ao Jurássico Médio e Superior.
Para o intervalo de tempo considerado, os marcadores estratigráficos normalmente utilizados em sedimentos marinhos são as amonites, um grupo extinto de moluscos cefalópodes, que se assemelhavam às actuais lulas e chocos. A ocorrência destes fósseis no Jurássico Médio do Cabo Mondego (flanco norte da Serra da Boa Viagem) é particularmente relevante, na medida em que, com base na sua distribuição vertical, se conseguem precisar as escalas do tempo geológico.
Os locais com registo sedimentar expressivo e com conteúdo elevado em amonites são de grande interesse para as Ciências da Terra, dado que testemunham com rigor determinado intervalo de tempo da História da Terra. O Jurássico Médio do Cabo Mondego apresenta essa particularidade, sendo há muito considerado referência, a nível internacional, nas discussões da especialidade.
O Jurássico Superior, cujos sedimentos assentam sobre o Jurássico Médio (sector sul da Serra da Boa Viagem), proporciona a observação de corpos sedimentares característicos de ambientes de transição (recifais, lacustres, deltaicos).
O registo sedimentar inclui uma grande variedade de estruturas sedimentares bem definidas, acompanhadas de associações diversificadas de fósseis típicos de diferentes ambientes (corais, equinodermes, bivalves, braquiópodes, gasterópodes, crinóides, restos vegetais). É justamente nesta posição estratigráfica (Oxfordiano) que, em 1884, foram reconhecidas várias pegadas de dinossaúrios terópodes, atribuídas a megalosaurídeos."[3]


"A História Geológica do nosso país durante os tempos jurássicos está inscrita nas falésias do Cabo Mondego. 
Preserve-a porque ela não se repete." 

Para Helena Henriques, lutadora pela classificação, sobretudo, para impedir “a delapidação” deste património comum de invulgar interesse e valor histórico-científico. “O emparedamento da zona frente ao restaurante Teimoso, por exemplo, a ser continuado pela linha da Marginal, significaria a destruição das falésias que restam”, afirma, acrescentando porém que “a vulnerabilidade face à urbanização, daquela área”, é outra, senão a principal, das preocupações. 

Em 1996, a UNESCO declarou o Cabo Mondego como estratotipo do limiar Aaleniano-Bajociano, os dois subperíodos em que se divide o Jurássico médio, período ocorrido entre há 180 milhões e 151 milhões de anos[3]. A razão da distinção é de fácil compreensão. Nas sucessivas camadas geológicas das falésias do Cabo Mondego são visíveis diversos elementos fósseis conservados: pegadas de dinossauros, amonites (cefalópodes fósseis de concha espiralada) e vegetais, pelo que qualquer descoberta ou metodologia de investigação só será validada após comparação com o Cabo Mondego, transformando este local num “marcador de tempo com valor global”[3]. O caricato, porém, é que apesar do estatuto internacional, as falésias morrem de esperar pela classificação até porque os primeiros pedidos datam dos anos 70, e Helena Heniques declarou publicamente acreditar que é “a falta de cultura científica da população” que tem permitido “a inércia de quem manda”, um motivo aliado aos alegados “interesses económicos a que a Cimpor não é alheia”. [3]

Um dos motivos importantes a avaliar é, porquê neste local, porquê no Cabo Mondego? Pelos paleontólogos é defendido que que, há cerca de cento e cinquenta milhões de anos, a costa portuguesa tinha um aspeto bem diferente. “Seria, então, constituída por lagoas e deltas de rios, que inundavam uma vasta região pantanosa, com águas pouco profundas, calmas e mornas. Devido às condições climatéricas, aqui se concentrava uma rica vegetação, que atraía os dinossauros, na sua maioria vegetarianos. Mas estas características foram benéficas para a História ainda por outra razão. Elas criaram as melhores condições para uma fossilização duradoura dos animais mortos. A comprovar esta teoria, estão as centenas de achados fósseis de plantas, peixes, conchas, escamas, tartarugas, crocodilos e outros animais de menor porte, que frequentaram a região, nas épocas de ouro dos dinossauros, Jurássico Superior e Cretáceo. Por isso, toda a zona Oeste é hoje um verdadeiro santuário, que segundo os estudiosos deve ser alvo de uma preservação “total e imediata”. Impedir a construção clandestina, não vazar lixos, evitar a abertura de acessos mesmo até ao areal das praias, são algumas das medidas exigidas pelos defensores daquele património.”[3]

Perante estes factos e estas lutas devemos preocupar-nos e ser solidários principalmente tendo em vista o legado a deixar aos vindouros. Com a classificação de locais como este “Cabo Mondego”, quer como Monumento Natural quer como Património da Humanidade (através da UNESCO), “fica garantida a preservação de um local, onde facilmente se compreendem questões como a evolução biológica e a configuração do planeta, ao longo de milhões de anos”. [3]

Para já, no que respeita à classificação pela UNESCO, não há mais do que um grupo de pressão, mas a concretizar-se, este seria um passo dos passos mais importantes.

Apoiem e divulguem esta causa!

                                                                            FIM

Fontes e Bibliografia:
[1] – Brilha, J. (2005). Património Geológico e Geconservação. Braga: Palimago
[2] - Cabo Mondego. In Infopédia [Em linha]. Porto: Porto Editora, 2003-2012. [Consult. 2012-05-07]. Disponível na www: <URL: http://www.infopedia.pt/$cabo-mondego>
[3] - http://www.progeo.pt/jornais/cabo_mond4.htm, [Consult. 2012-05-07]

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